Essa entrada é em homenagem ao lançamento de hoje: a versão física de In Rainbows nas lojas (da Europa e Estados Unidos).
A história do álbum em si merece ser repetida. O contrato do Radiohead com a EMI expirou, as negociações para renovação foram um fiasco e, sem gravadora, a banda não se apertou. Decidiram lançar um novo álbum e não contaram para ninguém, nem sequer para as esposas. Se jogaram em um estúdio caseiro, continuaram com o trabalho de (pasmem) 21 anos, e surpreenderam o mundo com 10 faixas novas para quem quisesse ouvir.
E foi para quem quisesse mesmo. Eles não prensaram o trabalho e colocaram à disposição dos fãs no site do grupo em formato digital. Quanto custava? O valor que o ouvinte considerasse justo, mesmo que fosse zero. Em dezembro tiraram a “lojinha” do ar e, hoje, depois de um acordo com duas gravadoras, o álbum chega às lojas em CD com a sua única tiragem (segundo os envolvidos, quando essa tiragem acabar, já era, sorte de quem comprou).
Muita gente reclamou da novidade. Consagrado, conhecido, considerado um dos maiores grupos musicais do mundo, com uma massa de fanáticos que o seguiria por todos os lugares, o Radiohead pode se dar ao luxo de ganhar dinheiro apenas com as turnês. Mas já não é assim que funciona? As gravadoras lucram com os discos e os artistas com os shows. A única diferença é que o Radiohead eliminou a gravadora no processo, seguindo a tendência de todo o mundo da música, desde Madonna ao grupo independente do barzinho da esquina.
Essa atitude tão contemporânea rendeu ao grupo uma exposição nunca antes imaginada, virando discussão até nas revistas especializadas de Marketing e negócios.
Com toda essa polêmica, a música acabou ficando um pouco de lado e muitos não perceberam a cristalização de algo anunciado.
In Rainbows, feito sem nenhuma interferência de major, consolida uma identidade específica do grupo que passeia entre gêneros. O Radiohead se especializou em rock eletrônico, usando o máximo que pode dos baixos – seguidores assumidos de Joy Division – misturando com o aprendizado adquirido no processo experimentalista dos álbuns Kid A e Amnesiac.
É difícil definir o que é rock e o que é eletrônico entre as guitarras ácidas de “Bodysnatchers”, a bateria de “Weird Fishes/Arpeggi” e os samplers da faixa “15 Step” que abre o álbum. Isso tudo sem esquecer o sempre presente piano, com destaque em “Videotape”, que relembra a melancolia ‘radioheadiana’ tão conhecida pelos fãs. Às vezes um surpreendente som de violão, a la Los Hermanos, invade as músicas (como em “House of Cards”) e cria um clima diferente do que esperamos dos apocalípticos discos do Radiohead.
De certa forma, o In Rainbows consegue, ao longo de suas 10 faixas (algumas já conhecidas dos freqüentadores dos shows, porém com arranjos e produção diferentes), demonstrar que a banda, apesar do cenário e contexto, está em uma posição confortável quando se trata de música. O álbum mostra confiança e é capaz de intercalar melancolia e grandiosidade, quase alegrando o tom obscuro e depressivo de sempre. É aqui que mora a cristalização mencionada, saindo do rock de garagem inglês, passando pelo eletrônico psicodélico, até chegar numa mistura homogênica de gêneros.
O álbum deixa clara a evolução do grupo que parecia confuso nos últimos anos, quase se definiu em Hail To The Thief, mas se encontrou, finalmente, em In Rainbows.