12 fevereiro, 2008

Hourglass, do Dave Gahan

Qualquer fã do Depeche Mode sabe que a banda funciona pela união da genialidade na composição de Martin L. Gore e a voz única de Dave Gahan (sem esquecer a seriedade e organização de Fletcher).

Quando qualquer um dos dois decide voar solo, o resultado sempre deixa a sensação que “falta algo” (Andrew Fletcher não conta, pois trabalha solo como DJ, outro clima). Isso acontece com a maioria das grandes bandas, é o conjunto que faz a diferença. Martin, por exemplo, lançou em 1989 o Counterfeit EP e, em 2003, Counterfeit², uma continuação. Nenhum dos dois foi sucesso. São discos medianos e não trazem aquela essência do trabalho em grupo.

HourglassDave Gahan tentou seu primeiro trabalho solo com Paper Monsters em 2003. Medíocre é a melhor palavra para definir o álbum. Aí você pensa: depois disso ele desiste. Não, não. Em 2007, Gahan voltou à carreira solo com Hourglass e, para a minha surpresa, é um bom disco.

Atenção: eu disse bom. Se você comparar com qualquer álbum do Depeche Mode, Hourglass não faz nem para o café. Mas ignorando o fato que o artista é também vocalista de uma das maiores bandas do mundo, no geral o CD entrega o que propõe. Abusando da melhor característica de sua voz, a sensualidade, Dave montou um disco de 10 faixas bem trabalhadas e com ótimos arranjos, em parceria com Andrew Phillpott e Christian Eigner.

Saw Something abre o disco com uma participação de John Frusciante na guitarra e define o clima do disco: calma, charmosa, um pouco obscura e cheia de elementos eletrônicos. Em seguida vem Kingdom, primeira canção de trabalho, um pouco mais “dark” que a anterior e culmina em um lindo arranjo no refrão.



O videoclipe de Kingdom, dirigido por Jaron Albertin,
é meio sem sentido e tem cara de “baixo orçamento”,
mesmo não sendo o caso. Confuso, Dave.

Deeper & Deeper obriga qualquer ouvinte a lembrar porque Dave Gahan é um dos vocalistas mais admirados do planeta. Sua voz aparece arranhada, com efeitos e mergulhada em uma batida contagiante. A voz continua se exibindo em 21 Days, uma faixa menos criativa que traz synths muito próximos dos usados em algumas faixas mais lentas do Playing the Angel e Exciter (ambos do Depeche Mode).

Miracles é o primeiro escorregão do disco. Tentando um clima de balada romântica, a música não consegue atingir o objetivo e se transformou em pouco mais de 4 minutos de melodia insossa. Use You volta para a idéia de sedução e, bastante eletrônica, transporta o ouvinte para um ambiente grotesco.

Insoluble é experimentalista em excesso, difícil de agradar, assim como o resto do disco. Seguida por Endless, a música cuja letra dá nome ao disco, uma segunda tentativa de trazer o grotesco, mas dessa vez mal sucedida. Dave tenta se redimir um pouco com o refrão grandioso de A Little Lie, mas é um desperdício em meio ao restante da faixa.

Em compensação, com a última canção do disco, Down, a redenção chega e fica aquela boa impressão. Uma bela balada com destaque para o dobro que chora ao fundo.

Uma curiosidade: a capa do disco, o encarte e a logo do álbum foram criados pelo Anton Corbjin, o mesmo de "Control".

Em resumo, os fãs do Depeche Mode podem se surpreender com Hourglass e, como eu, acabar comprando o cd. Já para aqueles que não são fãs da voz de Dave vai ser difícil considerarem o disco sequer interessante.